Cristiana

Cistiana
Tudo começou com um inocente romance virtual.
Toda história tem um começo, um meio e fim, isso não é segredo de ninguém. Mas como eu sempre adorei fazer tudo diferente, do meu jeito vou começar pelo meio. O mês de fevereiro está acabando e cá estou, sentado numa lanchonete de rodoviária. Faltam aproximadamente 15 minutos para o meu ônibus partir. Estou com a passagem comprada, dobrada dentro do bolso da calça. O destino? Porto Alegre.
Agora vocês já sabem onde estou e pra onde vou. Só me resta contar o objetivo da viagem, certo? Sinto decepcionar-lhes, mas o destino não tem nada de incomum ou misterioso, pra falar a verdade é tão comum que chega a ser brega. Estou indo conhecer uma garota. Na verdade não é apenas uma garota, e sim uma garota muito especial. Não sei se posso dizer que a amo, afinal de contas eu nunca a vi pessoalmente. Sim, vocês já sacaram do que estou falando, certo? Sim, eu a conheci pela internet. Não sei por que estou me sentindo envergonhado em assumir isso, afinal de contas quem nunca viveu um amor virtual que atire a primeira pedra. Era como eu esperava, nenhum sinal de pedra. Aposto que você, sim, você mesmo, já viveu um romance virtual. Hoje em dia é algo muito comum, não precisa se sentir envergonhado ou envergonhada.
Tudo começou em dezembro do ano passado (12/2008), quando eu entrei numa sala de bate papo. Curioso, visto que eu raramente entro nestas salas, mas naquele dia eu resolvi entrar. Após várias tentativas frustradas alguém me respondeu, seu apelido era Atrevida. É engraçado como eu me lembro exatamente o que ela escreveu pra mim: "oi, eu quero muito tc com vc, achei seu nick muito charmoso". Meu apelido naquele dia foi Menino do Fim da Rua, em homenagem a um livro que eu li quando criança. Mas isso não vem ao caso. O importante foi que eu e a Atrevida ficamos horas e horas naquela sala de bate papo. A sintonia entre nós foi algo assustador, eu tinha a nítida sensação de que a conhecia há décadas. Digamos que foi paixão a primeira teclada. O verdadeiro nome de Atrevida era Cristiana, a sua idade era 19 anos. É claro que naquela mesma noite eu já anotei seu e-mail, msn e tudo mais que eu poderia saber sobre ela, exceto telefone e endereço, coisa que ela se recusou a fazer. Mas eu não fiquei chateado com isso, é normal as pessoas sentirem um certo receio ao fornecer tais informações logo de cara. Nunca se sabe realmente com quem está teclando, não é?
Os dias foram passando e nosso encontro no msn foram ficando cada vez mais intensos. Um dos momentos de maior suspense foi quando ela resolveu me enviar sua foto. Este momento é crítico, visto que você deposita toda sua fantasia na pessoa do outro lado e, convenhamos, a fantasia é mais divertida que a realidade. Bom, em certos aspectos, é claro. Mas Atrevida não me decepcionou, muito pelo contrário, Atrevida era lindíssima. Morena, cabelos negros, maravilhosos, um olhar meigo e lábios daqueles que você precisa beijar imediatamente. Resumindo, eu fiquei apaixonado. Agora eu gostava da personalidade e me sentia atraído fisicamente. Só faltava saber se ela também iria gostar da minha foto.Enviei logo em seguida e fiquei super nervoso. Bobagem, eu não deveria, ela gostou de mim, ou melhor, da foto. Tudo bem que foto é foto, mas já é alguma coisa, ainda mais se você está a quilômetros de distância. Sim, moramos bem longe um do outro. Eu moro no interior de São Paulo.
Eu vou tentar encurtar um pouco este período em que eu e Atrevida, melhor, Cristiana, ficamos neste namorico virtual. eu sei que se você já passou por isso sabe exatamente do que estou falando. Seu coração dispara ao conversar com a pessoa, você sente a sua presença mesmo estando tão distante e nem sequer conhecê-la pessoalmente, sente sua falta, e outras sensações estranhas que só você que já viveu ou está vivendo um amor virtual sabe. É muito estranho. E não tente contar para aquele que nunca viveu está experiência, pois certamente esta pessoa vai rir e tirar aquele sarro da sua cara.
Completando um mês de namoro virtual e Cristiana ainda se recusava a me passar seu telefone, endereço, sobrenome e algumas outras informações. Eu comecei a suspeitar de algo. logo de cara eu pensei que ela poderia ser casada, em uma de nossas conversas, eu tentei arrancar esta informação dela a todo custo, mas foi em vão. Brigamos e passamos duas semanas sem conversarmos. Foi terrível, eu me senti como se tivesse arrancado um pedaço de mim. Fiquei muito mal, então resolvi pedir desculpa e ela aceitou. Voltamos a teclar, passamos as madrugadas teclando no msn. eu queria muito poder ouvir sua voz, mas ela se recusava. Ela sempre alegava que o motivo eram os pais, os quais eram severos. Eu perguntava porque ela não ligava de um telefone publico e a resposta era sempre a mesma, meus pais estão sempre me vigiando. Ah, Cristiana, também não tem celular, ou diz que não tem. Resumindo, estou completamente envolvido com uma garota que eu nunca vi pessoalmente ou ouvir sua voz. Parece loucura, mas não é. Ou é?
Eu não suportava mais ficar apenas teclando com ela, eu queria vê-la pessoalmente, poder ouvi-la, toca-la e tudo mais. Aqueles, nossos encontros virtuais era deliciosos, mas não dá pra se comparar com olho no olho. Mas sempre que eu tentava saber o endereço, ela desconversava ou dava sempre as mesmas respostas. Isso me deixava maluco. Foi ai que eu resolvi investigar. Tomei a liberdade de chamar um amigo meu pra me ajudar. Ele sabe tudo sobre invasão de micros. Eu fiquei um pouco preocupado em deixá-lo invadir o micro da Cristiana, mas eu estava desesperado, eu precisava fazer alguma coisa. E consegui o que eu queria. Quero dizer, o meu amigo conseguiu. Eu não tenho a menor idéia do que ele fez, só sei que eu conseguiu várias informações valiosíssimas, tais como telefone e o endereço da casa de Cristiana. Sim, ela me contava poucas coisas, mas o pouco que contou era verdade. Ela morava em Porto Alegre.
Nos dias seguintes eu vivi um dilema, eu não sabia se ligava pra ela ou não. Será que seus pais eram a causa de todo aquele medo? Será que ela era casada? O que eu deveria fazer? Eu precisava tanto ouvir a sua voz, Os dias foram se passando e eu pensei que a minha cabeça iria explodir a qualquer momento. Eu precisava tomar alguma atitude. As informações estavam todas ali naquele pequeno pedaço de papel, o telefone, o endereço, tudo o que eu precisava para me aproximar de Cristiana.

Mas foi ontem que eu tomei a decisão de viajar pra Porto Alegre e conhecê-la pessoalmente. Se esta aventura vai dar certo eu não sei. Só sei que já viajei bastante para desistir. Saí de casa às 7 da noite, de ontem e agora estou aqui em Curitiba, são exatamente 6H30 da manhã. Meu próximo ônibus já está pra sair a qualquer momento, agora com o destino final, Porto Alegre. Quando o ônibus parou eu confesso que minhas pernas ficaram meio bambas. Foi curioso como foi apenas naquele momento eu caí na real. Mais algumas horas e eu vou estar frente a frente com a Cristiane. É meio surreal.
entreguei a passagem ao motorista e ele percebeu minha tremura.
- Você está passando bem? -- perguntou o motorista.
- Sim, estou bem. Obrigado.
Eu estou suando frio. O que será que está acontecendo comigo? Tentei me concentrar e caminhar até a minha poltrona o mais naturalmente possível. Acho que consegui. Ajeitei-me na poltrona ao lado da janela e coloquei minha mochila no banco ao lado. Eu não quero ninguém perto de mim, não agora. Se o ônibus lotar eu retiro a mochila dali. Não, o ônibus ficou vazio, somente eu e mais quatro passageiros. O motorista deu a partida e meu coração voltou a acelerar. Se continuar assim eu vou sofrer um ataque cardíaco ao chegar em Porto Alegre.
Durante a viagem eu tentei de todas as formas relaxar e dormir um pouco, mas eu não consegui. Eu só pensava nela. Como será o seu olhar? Como será o seu cheiro? Será que ela vai gostar de mim pessoalmente? Será que eu vou gostar dela pessoalmente? eu preciso relaxar, estou tenso demais. Minha camisa está ensopada de suor. A primeira impressão é importante, e se eu continuar neste caminho vou chegar lá aos frangalhos.

Eu estava no meio de um terrível pesadelo, quando alguém me sacudiu pra lá e pra cá. Era o motorista. Nós estávamos em Porto Alegre, finalmente. Nem preciso dizer que meu coração disparou novamente, não é? Desci do ônibus sozinho, todos os outros passageiros já haviam descido. Minhas pernas estão pesando o triplo cada uma. Fiquei parado, meio sem saber o que fazer, por uns 5 minutos. Eu não acredito que estou perto dela, O mais curioso de tudo pe que já sonhei diversas vezes sobre nosso encontro e, acreditem ou não, a rodoviária é até parecida com a dos meus sonhos. PS: Eu jamais vi foto ou vídeo do local antes. Estranho, muito estranho.
Bom, agora eu só preciso de um táxi para chegar até ela. Nem precisei tirar o pedaço de papel para ler o nome da rua e do bairro, eu já os decorei. Entrei no primeiro táxi que eu vi. De repente todo aquele pavor se transformou em excitação. Estou sentindo que vai ser algo maravilhoso, algo que eu jamais vou me esquecer.

Levamos menos de 10 minutos para chegarmos até a casa de Cristiana. A corrida ficou em 17 reais, eu paguei 20 e não pedi o troco. Na verdade ele poderia me cobrar 100 reais e eu teria pago sem argumentar. Eu só quero uma coisa, tocar a campainha e ver Cristiana caminhar até o portão, até a minha presença.
Assim que o taxista virou a esquina eu apertei a campainha. Meu coração voltou a bater mais forte, quase saltando pra fora do meu peito. a casa fica atrás de um vasto jardim, o qual está bem descuidado, tomado por folhas velhas e secas. Chego a suspeitar de que a casa possa estar vazia. Será? Não, seria muita falta de sor... Alguém abriu a porta. Cristiana? Não, é uma senhora, aparenta ter uns 40 e poucos anos.
- O que você quer? -- gritou a mulher.
Minha voz travou. Tudo o que eu consegui foi sussurrar:
- Eu queria saber se a Cristiana está em casa.
A mulher não conseguiu me ouvir, mas eu não culpo até eu não consegui.
- O que você quer? -- ela tornou a perguntar, agora parecendo mais irritada.
Novamente eu só conseguir sussurra. A mulher caminhou por todo o jardim, vindo a minha presença.
- Em que posso ajudá-lo? -- ela perguntou, agora com um tom de voz suave. Nem parecia a mesma pessoa de alguns segundos atrás.
- Eu queria saber se é aqui que mora a CRistiana. -- finalmente consegui me expressar de forma clara.
A mulher esbugalhou os olhos, começando a chorar.
- A senhora está bem? -- perguntei, sem saber o que fazer.
A mulher continuo chorando, olhando para o jardim. De repente um senhor veio em sua direção.
- O que aconteceu, Marina? -- gritou ele, correndo em sua direção.
a mulher continuou chorando desesperadamente. O homem olhou pra mim, meio espantado.
- O que ouve? -- ele perguntou, irritado. - O que você fez?
O homem aproximou-se da senhora e a abraçou, mas continuava me olhando, irritado.
- Perdoe-me senhor. -- eu disse, tremendo de nervoso.
- O que você quer?
- Eu só perguntei a ela se é aqui que mora a Cristiana.
Neste momento o homem me olhou da mesma forma com que a mulher me olhava minutos atrás.
- Perdoe-me, -- eu disse. -- parece que eu errei de casa, perdoe-me.
- Não exatamente. -- disse o homem, abraçando a senhora. - Aqui é a casa da Cristiana.
Fiquei surpreso.
- Ela está? -- perguntei.
- Não. Cristiana morreu a 6 meses, meu rapaz.
Entrei em desespero. Eu não acreditei.
- O senhor está brincando comigo.
O homem ficou enfurecido.
- Brincadeira? Quem você acha que eu sou, moleque?
- Perdão, senhor, mas isso não pode ser verdade! Já faz 2 meses que eu converso com ela, quase diariamente!
- Olha aqui, eu não sei quem é você, eu só peço que saia daqui imediatamente. Olha só o que você fez com a minha esposa! que brincadeira de mau gosto é esta?
- Perdão, senhor, mas não é brincadeira, eu...
- Eu vou chamar a policia. Qual o seu nome?
- Calma, senhor,não precisa fazer isso. Eu vou embora. Meu nome é Juliano.
Quando eu disse meu nome notei que ambos ficaram ainda mais assustados.
- Como é mesmo seu nome? -- perguntou o homem.
- Juliano. -- repeti.
-Não pode ser. -- sussurrou o homem, olhando espantado para a mulher.
O que foi? -- perguntei, assustado.
A mulher parou de chorar, e abriu o portão pra mim.
- Entre por favor.
Olhei meio espantado.
- Não precisa ter medo. -- disse o homem. - Temos algo que provavelmente você queira ver.
entrei. Eles me pediram pra segui-los pelo jardim. Não disseram nenhuma palavra. eu também não conseguir dizer nada. Ainda estou em estado de choque.De repente eles pararam diante de uma arvore. Ambos olharam pra mim.
- Dê uma olhada. -- disse o homem, mostrando a árvore para mim.
Examinei a arvore e não compreendi o que estavam querendo me mostrar.
-Não estou vendo nada. -- eu disse.
- Olhe com mais atenção.
Fiz o que o homem me pediu e finalmente compreendi do que se tratava. Havia alguns desenhos na arvore, como se tivessem sido feitos de canivete, desenhos em forma de coração, com os nome Cristiana e Juliano escritos no meio.
- Faz pouco mais de um mês que isso começou a aparecer nas arvores. -- disse a mulher, com os olhar vermelhos.
- Em todas as arvores.
Tire sua própria conclusão.